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sexta-feira, 27 de março de 2009

Voluntarismo e Objetivismo


Agradeço ao Igor Reis pelo questionamento que permitiu a
produção deste texto.

VOLUNTARISMO OU OBJETIVISMO?
Nota sobre o fundamento jurídico do Direito Internacional Público

Prof. Ms. Rodrigo Bastos Raposo

Quando se fala de sociedade, está se falando automaticamente de sociedade jurídica. Quando se trata da sociedade internacional, não é diferente: a existência de uma estrutura de relacionamentos entre pessoas, empresas, Estados e Organizações Internacionais pressupõe a existência de regras que a organizem de alguma forma.

No entanto, a simples constatação da existência do Direito Internacional Público não é suficiente para esclarecer a questão de seu fundamento. Questão que pode ser formulada da seguinte maneira: por que os atores das relações internacionais, em particular seus protagonistas, os Estados, devem obedecer ao direito internacional?

Pode-se identificar duas correntes que procuram responder a essa indagação: uma decorrente dos princípios da igualdade soberana dos Estados e do livre consentimento, chamada por isso de concepção voluntarista; outra, calcada na idéia de que certas regras jurídicas, por sua natureza, são superiores à vontade dos Estados, chamada de concepção objetivista.

A concepção voluntarista trabalha com a idéia de que o direito internacional deve ser respeitado porque é fruto do livre consentimento dos Estados, manifestado expressamente por meio dos tratados e tacitamente por meio dos costumes internacionais.

No entanto, a visão voluntarista teria dificuldades em responder por que razões os Estados recém-independentes, que evidentemente não tiveram oportunidade de manifestar seu consentimento porque não existiam, devem obedecer ao direito internacional.

Dessa indagação surgem pelo menos duas explicações possíveis, uma baseada em uma concepção objetivista do direito internacional e outra que procura preservar a concepção voluntarista.

A concepção objetivista do direito internacional procura observar no fenômeno do direito internacional certa autonomia em relação à vontade dos Estados. Ela parte da idéia de que existem certos preceitos básicos que fundam a ordem internacional e que existem independentemente de consentimento.

Alguns desses preceitos seriam de ordem lógica, pressupostos para que o sistema de direito internacional funcione, a exemplo dos princípios do pacta sunt servanda e da boa fé. Outros teriam conteúdo material e diriam respeito a um jusnaturalismo histórico-cultural, que assume que a sociedade internacional evolui e que certos retrocessos não são possíveis, havendo portanto, em decorrência da evolução da sociedade internacional, algumas obrigações que existiriam independentemente da vontade dos Estados. Tais obrigações poderiam ser ilustradas pelas regras de jus cogens, pelas normas contidas na Carta das Nações Unidas e nos Pactos de Direitos Humanos de 1966.

A resposta voluntarista para a questão procura manter a livre manifestação da vontade e aponta como uma solução possível para a questão do fundamento de obediência das novas unidades soberanas ao direito internacional o instituto da sucessão de Estados.

A sucessão de Estados é a disciplina que define as conseqüências da extinção e do surgimento de entes soberanos. Nesses casos, dirão os voluntaristas, os novos Estados sucedem os antigos nas obrigações por estes assumidas e, portanto, não podem se furtar ao respeito às regras de direito internacional já estabelecidas e aceitas pelo Estado a partir do qual se originaram.

A concepção voluntarista traz uma visão forte da soberania estatal, a concepção objetivista, por sua vez, destaca o poder regulador do direito internacional.

Evidentemente, a segunda concepção, por sua nobreza moral e jurídica, tem forte apelo junto aos jusinternacionalistas, no entanto, precisa ser matizada para explicar a prática das relações internacionais.

Já o voluntarismo, se extremado, deixaria ficar o direito internacional como simples instrumento dos interesses dos Estados, perdendo o conteúdo moral sem o qual as normas jurídicas não têm razão de ser.

Pode-se afirmar, em conclusão, que a perspectiva voluntarista auxilia em uma compreensão mais descritiva da realidade internacional, ao passo que a concepção objetivista permite elaborar uma visão mais prescritiva da mesma. Juntas elas compõem o acervo de concepções necessárias para a construção de um Direito Internacional Público enquanto disciplina científica a serviço do ideal de justiça.

10 comentários:

  1. Ao tratarmos do Direito Internacional verifica-se uma organização sistemática que deve ser respeitada para que a idéia de soberania entre os Estados seja vinculante. Assim, busca-se mostrar qual o fundamento, qual o papel do Direito Internacional para os Estados membros? O que se verifica é o direito Internacional X Soberania Estatal, para tanto, correntes como a voluntarista e a objetivista mostram os motivos para a aceitação das normas do Direito Internacional e suas divergências. Assim, a corrente voluntarista afirma que a voluntariedade e o livre consentimento é o marco principal para aceitação de normas do Direito Internacional e por tratar de aceitação livre do Estado Soberano deve ser respeitado. Em contra partida a corrente objetivista alega que algumas regras ultrapassam o Estado e que há fundamentos pré-existentes no âmbito internacional e que por esse motivo devem aceitar as normas impostas pelo Direito Internacional. Assim, partindo desta análise, independente da corrente a ser seguida, percebe-se que o Direito Internacional busca o alcançar um resultado passivo e harmonioso entre os países.
    VIVIANE NUNES 8º PERIODO NOTURNO

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  2. Jonathan Percivalle - Santos - SP3 de março de 2010 às 18:58

    Olá!
    Sou aluno do 3º semestre de Direito da Unisantos e gostaria de parabeniza-lo pelo belíssimo artigo escrito pelo senhor.
    Ainda não tenho a matéria de D.Internacional, mas participo do grupo de estudos dessa matéria e o seu artigo me esclareceu muitas dúvidas!

    Abraço

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  3. Sem dúvida este texto serviu para dirimir todas as dúvidas sobre Vonluntarismos e Objetivismo.
    Parabéns,
    Rodrigo Moreira 7º Período de Direito FDC

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  4. Artigo muito bom e interessante, dada sua relevância no Direito Internacional.

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  5. Parabéns pela exposição, professor! Muito esclarecedora e de conclusão brilhante. Seu blog passará a figurar entre meus sites de estudo.

    Isabella Radd Silva. Bacharel em Direito pela UFJF e especialista em Direitos Fundamentais pela PUC/RS.

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  6. Parabéns.

    Informações importantíssimas foram destacadas ao tempo certo de sua explanação. Útil e válido. São adjetivos que posso nomear em primeira instância, de modo generalizado.

    Como a Isabella afirmou, afirmo outrossim. Este blog fará parte de meu orbe de fontes estudantis.

    Lucas Francisco. Bacharelando no Curso de Ciência Humanas e Jurídicas na AESO (Faculdades Integradas Barros Melo).

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  7. Valdir Fernandes Gomes, décimo semestre em Direito UNIP, os demais colegas já explanaram tudo, parabenizo a todos o excelente artigo impecável melhor não poderia ser, sem palavras estou radiante o ao conteúdo.

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  8. qual desses teorias o Brasil pratica?

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    Respostas
    1. Bom dia!
      Na verdade, quem adota uma teoria é o pesquisador, ao adotar certos pontos de partida para explicar o fenômeno do direito internacional.
      As teorias buscam explicar, de forma generalizável, o conjunto dos comportamentos estatais que dão origem ao direito internacional.
      Dito de outro modo, essas teorias são explicativas e buscam explicar o fundamento do direito internacional para todos os membros da comunidade internacional.
      Assim sendo, os países não adotam uma ou outra. A prática estatal, ou a existência do fenômeno jurídico, antecede a formulação das teorias.
      Obrigado pela pergunta.

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