A pergunta abaixo motivou esta postagem, obrigado, Álvaro.
alvaroApr 19, 2012 08:47 AMolá professor sou Álvaro estudante de Direito da Faculdade de Direito de Angola.
gostaria que me explica-se, como é que os sujeitos singulares podem ser sujeitos de Direito Internacional?
Olá Álvaro! Obrigado pela pergunta.
Entendo que por sujeitos singulares estás te referindo aos
indivíduos.
Bem, para o direito internacional clássico o indivíduo não é
sujeito do direito internacional. Os sujeitos do direito internacional clássico
são os Estados e, por decorrência da vontade dos mesmos, as organizações
internacionais.
Nessa concepção, os indivíduos seriam apenas objeto de
proteção do direito internacional, a exemplo das disposições relativas ao
direito humanitário, adotadas a partir do final do século XIX, ou mesmo das
disposições de direitos humanos propriamente ditas, adotadas a partir do segundo
pós-guerra.
Ainda de acordo com a concepção clássica, o direito
internacional se dirige exclusivamente aos Estados, sendo que estes têm a
incumbência de praticar os atos ou produzir as legislações necessárias para que
as disposições internacionais que porventura outorguem direitos ou proteção aos
indivíduos adquiram eficácia.
Logo, pode-se concluir que na visão clássica os indivíduos
só podem ser atingidos pelo direito internacional por meio da intermediação
estatal. Mesmo no caso dos direitos humanos e de seus sistemas de monitoramento
(por exemplo, o sistema do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos)
ou adjudicação (por exemplo, a Corte Europeia de Direitos Humanos), os
indivíduos só têm acesso aos mesmos, isto é, direito de fazer comunicações
individuais, denúncias, postulações judiciais, devido a um compromisso anterior
assumido pelo Estado que supostamente violou direitos humanos. A base do jus
postulandi dos indivíduos, portanto, não é um direito subjetivo inerente, mas
sim uma outorga estatal feita por meio de um tratado anterior.
Ao longo da segunda metade do século XX, foi se
desenvolvendo a ideia de que os indivíduos são sujeitos do direito
internacional e, portanto, atingidos por ele independentemente da intermediação
estatal. Para essa concepção concorrem vários argumentos, dos quais pode-se
mencionar: o resgate da noção romana de jus gentium, pela qual se constata que
os indivíduos tinham reconhecidos certos direitos já na antiguidade, antes
mesmo de esboçar-se a ideia moderna de Estados; a concepção de jus gentium
medieval, de origem teológica, alicerçada no reconhecimento da igual humanidade
de todos os indivíduos, cristãos ou não; a ideia da responsabilização dos individuos
por crimes internacionais, cujo marco foi a discussão acerca do julgamento de
Guilherme II após a I Guerra Mundial e que fundou os controvertidos tribunais
de Nuremberg e Tóquio; e as discussões mais recentes sobre a dignidade humana e
os direitos a ela inerentes.
Esses argumentos rompem com a concepção voluntarista
clássica (cujos precursores foram Moser e Vattel) e mesmo com a concepção
positivista normativista que a sucedeu (representada por Kelsen e Verdross,
entre outros), constituindo uma proposta para o direito internacional ancorada
em valores substanciais, concebidos a partir do posicionamento do ser humano
como origem e propósito de todo o direito.
Então, respondendo à pergunta, o indivíduo é sujeito do
direito internacional por ser a própria razão de ser do direito.
Essa posição, apesar de sua evidente nobreza moral, não é
pacífica, por exemplo, ela é dominante na Corte Interamericana de Direitos
Humanos, mas é minoritária na Corte Internacional de Justiça.