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sábado, 23 de julho de 2011

FICHA DE LEITURA: MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. 1053p.

CONCEITO JURÍDICO DE INTERESSE PÚBLICO

"[...] interesse público [...] qualquer ato administrativo que dele se desencontre será necessariamente inválido" (MELLO, 2007, p. 56).

"[...] interesse público [...] se constitui no interesse do todo, ou seja, do próprio conjunto social [...] não seconfunde com a somatória dos interesses individuais, peculiares de cada qual (MELLO, 2007, p. 56).

"[...] o necessário é aclarar-se o que está contido na afirmação de que interesse público é o interesse do todo, do próprio corpo social, para precatar-se contra o erro de atribuir-lhe o status de algo que existe por si mesmo [...] como realidade independente e estranha a qualquer interesse das partes [...] interesse público [...] é função qualificada dos interesses das partes [...]" (MELLO, 2007, p. 56-57).

"[...] pode haver um interesse público contraposto a um dado interesse individual, sem embargo, a toda evidência, não pode existir um interesse público que se choque com os interesses de cada um dos membros da sociedade [...] existência de uma relação íntima, indissolúvel, entre o chamado interesse público e os interesses ditos individuais" (MELLO, 2007, p. 57).

"[...] o interesse público, o interesse do todo, do conjunto social, nada mais é que a dimensão pública dos interesses individuais, ou seja, dos interesses de cada indivíduo enquanto partícipe da sociedade [...]" (MELLO, 2007, p. 57).

"[...] existe, de um lado, o interesse individual, particular, atinente às conveniências de cada um no que concerne aos assuntos de sua vida particular [...] existe também o interesse igualmente pessoal destas mesmas pessoas ou grupos, mas que comparecem enquanto partícipes de uma coletividade maior na qual estão inseridos [...]" (MELLO, 2007, p. 58).

"[...] o interesse público deve ser conceituado como o interesse resultante do conjunto de interesses que os indivíduos têm quando considerados em sua qualidade de membros da Sociedade e pelo simples fato de o serem" (MELLO, 2007, p.58).

"[...] mito de que interesses qualificados como públicos são insuscetíveis de serem defendidos por particulares (salvo em ação popular ou ação civil pública) [...]" (MELLO, 2007, p. 59).

"[...] equívoco [...] de supor que, sendo os interesses públicos interesses do Estado, todo e qualquer interesse do Estado [...] seria ipso facto um interesse público" (MELLO, 2007, p. 59).

Direito subjetivo público

"[...] os indivíduos têm direito subjetivo à defesa de interesses consagrados em normas expedidas para a instauração de interesses propriamente públicos, naqueles casos em que seu descumprimento pelo Estado acarreta ônus ou gravames suportados igualmente por cada qual" (MELLO, 2007, p.59).

"[...] Eduardo García de Enterría: 'Cuando um ciudadano se ve perjudicado en su ámbito material o moral de intereses por actuaciones administrativas ilegales adquiere, por la conjunción de los dos elementos de perjuicio y de la ilegalidad, un derecho subjetivo a la eliminación de esa actuación ilegal, de modo que se defienda y restablezca la integridad de sus intereses" (GARCÍA apud MELLO, 2007, p. 62).

Interesses primários e secundários do Estado

"[...] equívoco muito grave de supor que o interesse público é exclusivamente um interesse do Estado, engano, este, que faz resvalar fácil e naturalmente para a concepção simplista e perigosa de identificá-lo com quaisquer interesses da entidade que representa o todo [...] (MELLO, 2007, p. 62).

"[...] não existe coincidência necessária entre  interesse público e interesse do Estado e demais pessoas de Direito Público" (MELLO, 2007, p. 62).

"[...] o Estado pode ter, tanto quanto as demais pessoas, interesses que lhe são particulares [...]" (MELLO, 2007, 63).

"[...] os interesses secundários do Estado só podem por ele ser buscados quando coincidentes com os interesses primários, isto é, com os interesses públicos propriamente ditos" (MELLO, 2007, p. 63).

"[...] a concreta individualização dos diversos interesses qualificáveis como públicos só pode ser encontrada no próprio Direito Positivo" (MELLO, 2007, p. 64).

"[...] não é de interesse público a norma, medida ou providência que tal ou qual pessoa ou grupo de pessoas estimem que deva sê-lo [...] mas aquele interesse que como tal haja sido qualificado em dado sistema normativo. [...] dita qualificação quem faz é a Constituição e, a partir dela, o Estado, primeiramente através dos órgãos legislativos, e depois por via dos órgãos administrativos, nos casos e limites da discricionariedade que a lei lhes haja conferido" (MELLO, 2007, p. 65).

terça-feira, 19 de julho de 2011

FICHA DE LEITURA: DOLINGER, Jacob. A evolução da ordem pública no direito internacional privado. Rio de Janeiro: Renovar, 1979. 282p.

INTRODUÇÃO
Esta ordem pública [universal], de natureza positiva, é uma nova página que se abre no Direito Internacional, em que o direito internacional privado, o direito internacional público e a ciência das relações internacionais se comporão para criar um clima de efetiva colaboração entre as nações, unidas nos mais variados aspectos e manifestações da vida no plano internacional (DOLINGER, 1979, p.XV).
CAPÍTULO I - DELINEAMENTOS DA ORDEM PÚBLICA NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO
A ORDEM PÚBLICA NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO
A dificuldade de definir o que seja ordem pública, que muitos reconheceram ser impossível, levou os autores a transpor a sua mera conceituação, para exemplificar seu campo de atuação, seus efeitos e suas conseqüências práticas. Da exemplificação passaram para a enumeração, no que desvirtuaram o princípio. E ao analisar as conseqüências, todos acabam se convencendo de que efetivamente não há um conceito preciso de ordem pública, pois descobrem sua relatividade, sua instabilidade, sua variabilidade no tempo e no espaço (DOLINGER, 1979, p.3).
Modernamente começa-se a delinear um aspecto totalmente novo da ordem pública no plano internacional, uma ordem pública verdadeiramente internacional, uma ordem pública de caráter universal, que ao invés de impedir a aplicação de determinadas leis estrangeiras, objetiva a colaboração no plano legislativo e jurisdicional para atingir objetivos que interessam à sociedade internacional como um todo. É uma ordem pública de caráter positivo, esta sim regra, e não exceção, eventualmente definível e de aplicação numa variedade de campos do direito (DOLINGER, 1979, p.7).
A ORDEM PÚBLICA NO DIREITO INTERNO
Observe-se a discussão em nossa doutrina sobre as leis imperativas. Seriam, todas elas, leis de ordem pública ou não necessariamente? (DOLINGER, 1979, p.8).
Segue-se a questão, qual a relação das chamadas leis de ordem pública na dicotomia de leis imperativas e leis supletivas? (DOLINGER, 1979, p.9).
Esta questão em torno da qual há tanta divergência e perplexidade desaparece se se reconhecer que não há nenhuma lei de ordem pública. As leis são de direito público ou de direito privado, estas podendo ser imperativas ou supletivas, admitidas as demais categorias e classificações encontradiças na doutrina que encerram conceitos paralelos aos da imperatividade e supletividade (DOLINGER, 1979, p.10).
Independentemente desta dicotomia, existe um princípio geral de direito, que realmente é de difícil definição, que realmente só pode ser identificado e conceituado em termos amplos, de idéia geral, de noção meramente indicativa, que comanda vários aspectos de todo o sistema jurídico interno. É a ordem pública que não tolera certos pactos. É verdade que as leis imperativas são inderrogáveis pela vontade das partes, e que para tanto não há necessidade de recorrer ao princípio da ordem pública, mas este cobre um setor mais amplo, não limitado às leis imperativas, e também não abrangendo necessariamente todas as leis imperativas (DOLINGER, 1979, p.10).
Ilustra esta amplidão e independência do princípio da ordem pública no direito interno a regra disposta no artigo 1133 do Código civil francês: “La cause est illicite quand elle est prohibée par la loi, quand elle est contraire aux bonne moeurs ou à l’ordre public” (DOLINGER, 1979, p.10).
O princípio da ordem pública é conceitual, filosófico, moral, indefinível, elástico, relativo, alterável, volúvel, sempre na dependência do conceito, da opinião, do sentimento, da sensibilidade média de um grupo social em determinada época que vai encontrar sua expressão clássica na sentença judicial (DOLINGER, 1979, p.10-11).
COMENTÁRIO: Partindo do direito privado e suas limitações, distinguindo as normas imperativas do princípio da ordem pública, que é instituidor de exceções, pode-se observar a emergência de uma ordem pública positiva (verdadeiramente internacional) que contempla normas de natureza privada e de natureza pública. Essas normas apresentam caráter transnacional, envolvendo influências recíprocas de direito internacional e de direito interno, e consubstanciam uma noção de legalidade que estabelece os limites do exercício legítimo da soberania estatal.

"LEIS DE ORDEM PÚBLICA" NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO
Portanto, não é a lei do foro que é de ordem pública, mas são determinados princípios jurídicos e morais do foro que não podem ser desrespeitados quando se aplica uma norma estrangeira (DOLINGER, 1979, p.16).
A DICOTOMIA DA ORDEM PÚBLICA
A ordem pública é uma só, sempre nacional, emana da legislação interna de cada país, logo, em direito internacional privado, não faz sentido distinguir entre ordem pública interna e ordem pública externa (DOLINGER, 1979, p.27-29).
[...] a primeira terminologia dá a impressão de que haveria uma ordem pública interna, própria de cada país, a qual se oporia uma ordem pública comum a todos os países e que, como o direito das gentes, seria verdadeiramente internacional. É verdade que há certas noções de ordem pública universal mas são infinitamente poucas e de rara utilização. É o caso da pirataria, da escravidão, do tráfico de brancas e do contrabando. (Sobre essa noção de ordem pública universal daremos nossa opinião mais adiante) (DOLINGER, 1979, p.33).
NOSSA POSIÇÃO
A ordem pública é utilizada pelo julgador na aplicação da norma, mas permanece sempre como um fenômeno externo, não embutido na própria norma. [...] E este princípio tem aplicação em vários níveis. Em sua gradação inicial, mais tênue, serve para garantir o império de determinadas regras contra a vontade das partes. [...] As regras de conexão do direito internacional privado tem seu efeito paralisado sempre que se entender que a ordem pública impede a aplicação de normas estranhas, por lhe serem chocantes, perturbadoras. Este é o segundo grau da ordem pública. [...] Mas, poderá haver um instituto estrangeiro tão chocante e que com tamanha intensidade represente um escândalo para o foro, que a sua ordem pública não admita sequer reconhecer uma situação já constituída e consumada. Esse é o terceiro e mais elevado grau do princípio da ordem pública. [...] A ordem a pública seria como um anjo da guarda do sistema jurídico de determinada sociedade. Sua aplicação varia de acordo com os graus de intensidade em que os princípios fundamentais do sistema venham a ser feridos (DOLINGER, 1979, p.40-41).
COMENTÁRIO: Em direito internacional privado, a ordem pública é um princípio que excepciona a aplicação de certas regras alheias ao foro. No direito transnacional, a ordem pública tem caráter positivo e de suas regras decorre o princípio da legalidade, balizador do exercício da soberania. No entanto, nenhuma das duas noções de ordem pública fundamenta o exercício de competência universal sem elemento de conexão, nem a aplicação direta no foro de norma de direito internacional público.

ORDEM PÚBLICA - REGRA OU EXCEÇÃO
[...] A regra de conexão e o princípio exceptivo da ordem pública são forças jurídicas válidas e justas na elaboração de um sistema que visa garantir o funcionamento da comunidade jurídica das nações, reconhecendo os efeitos daquilo que é aceitável e impedindo aqueles que são inadmissíveis. Mas esta exceção tem valor muito superior à própria regra de conexão, erigida em princípio fundamental do DIP [Direito internacional privado]. Princípio que será respeitado nas outras jurisdições, a não ser que em qualquer delas o seu princípio de ordem pública funcione em sentido oposto [...] (DOLINGER, 1979, p.55).
CAPÍTULO II - HISTÓRICO
CAPÍTULO III - DIREITO POSITIVO
NO SILÊNCIO DO TRATADO
[...] a [reserva da ordem pública] é inerente à toda regra de conexão seja ela legal ou convencional. [...] O comprometimento de um Estado através de uma convenção não pode significar que se tenha obrigado a aplicar cegamente o direito estrangeiro, inclusive normas que atentem contra sua ordem pública. [...] A Corte Internacional de Justiça manifestou-se no sentido da prevalência da ordem pública interna sobre tratados internacionais [...] em 28 de novembro de 1958 no caso “Guardianship of Infants” entre a Holanda e a Suécia (DOLINGER, 1979, p.100-101).
CAPÍTULO IV - ASPECTOS DA ORDEM PÚBLICA NO DIREITO INTERNACIONAL PRÍVADO
CONTEÚDO DA ORDEM PÚBLICA
A ordem pública de natureza política efetivamente é uma das três grandes manifestações da ordem pública, ao lado da moral e da econômica (DOLINGER, 1979, p.113).
A CONTEMPORANEIDADE DA ORDEM PÚBLICA
O princípio de ordem pública funciona como instituto de aplicação exclusivamente pretoriana. Ao Juiz e ao tribunal cabe exclusivamente a apreciação se a norma jurídica que se quer importar é ou não admissível em nosso meio, se o ato realizado ou o contrato firmado no exterior, podem ou não ter eficácia em nosso ambiente, se a sentença estrangeira que se quer executar em nossa jurisdição é aceitável ou não. Sendo assim, o critério há de ser o vigente à época em que o problema se apresenta perante o tribunal, único com autoridade para proclamar a possibilidade ou não da importação pretendida. [...] O mesmo critério foi proclamado pela Corte Permanente de Justiça Internacional em 1929 no famoso caso dos empréstimos sérvios e brasileiros [...] (DOLINGER, 1979, p.120-121).
A ORDEM PÚBLICA APLICADA PELOS TRIBUNAIS
Paulatinamente, a doutrina, de tanta autoridade no DIP [Direito internacional privado], pacificou-se no sentido de que efetivamente só ao juiz caberia detectar a ordem pública e rejeitar leis estrangeiras que lhe fossem chocantes (DOLINGER, 1979, p.127).
Com relação aos tribunais internacionais arbitrais, a aplicação da ordem pública deve ser feita a partir de uma perspectiva supranacional, cuja adoção se torna mais viável à medida que exista legislação comum passível de aplicação à matéria em causa (cf. DOLINGER, 1979, p. 129-130).

EFEITOS DA ORDEM PÚBLICA

A ordem pública pode assumir caráter supletivo, em certos casos, como nas circunstâncias em que uma norma estrangeira venha a ter seu cumprimento garantido por uma medida coativa que a ordem jurídica de origem não prevê, mas que existe na ordem jurídica do foro de aplicação (cf. DOLINGER, 1979, p. 140).

ORDEM PÚBLICA DE OUTRO ESTADO
Quando há choque entre as ordens públicas de dois países, cada um deles só atenderá à sua própria ordem pública. Se a aplicação de certas normas é indiferente à ordem pública do país do foro, pode-se indagar se o juízo do foro deve preocupar-se com a preservação da ordem pública de outra soberania, eventualmente envolvida no caso (DOLINGER, 1979, p.141-142).

A noção da ordem pública verdadeiramente internacional ou ordem pública universal [...] justifica a necessidade da mais severa atenção e respeito à ordem pública (que inclui nesse campo, a segurança, a saúde pública e demais formas de proteção à população) de outros países por parte daqueles que com eles comerciam. Este tópico foge à noção de ordem pública do DIP [Direito internacional privado], mas enquadra-se no conceito mais amplo de ordem pública universal (DOLINGER, 1979, p. 143).
Pillet (apud DOLINGER) enuncia o princípio do respeito universal da ordem pública internacional de outra soberania nos seguintes termos:
[...] 1) toda relação de direito estabelecida em violação de regras de ordem pública da lei competente deve ser considerada em toda parte como irregular e nula; 2) toda relação de direito estabelecida de conformidade com as regras de ordem pública da lei competente deve ser considerada válida (DOLINGER, 1979, p. 145).
COMENTÁRIO: Esse princípio fornece uma analogia com o dever de proteger a ordem jurídica internacional, que justificaria o exercício jurisdicional universal, bem como uma analogia com relação à invalidade de atos soberanos praticados em violação da legalidade internacional tal como definida pela ordem pública universal em seu sentido mais amplo.

A ordem pública verdadeiramente internacional ou ordem pública universal [...], comanda o respeito mútuo entre os países membros da sociedade internacional no sentido de respeitarem reciprocamente os efeitos da ordem pública dos outros, ressalvado o respeito a sua própria ordem pública (DOLINGER, 1979, p. 148).
A ORDEM PÚBLICA ECONÔMICA
Uma escola entende que a rejeição às pretensões dos governos confiscadores não precisa se basear na ordem pública, uma vez que representa algo mais grave, um atentado aos princípios do direito internacional público (DOLINGER, 1979, p. 222).
Está consolidada a jurisprudência no plano internacional de que o juiz interno não se manifestará sobre a legalidade ou validade de uma medida estrangeira de nacionalização. Os tribunais dos países exportadores de capital também têm adotado esta orientação. A questão objeto de divergência concerne aos efeitos extraterritoriais da medida estrangeira de expropriação, em que uma escola recorre ao princípio da ordem pública para rejeitar os efeitos desses confiscos, enquanto a outra aceita suas consequências baseada na teoria do “act of State” (DOLINGER, 1979, p. 223).
As normas criadoras do Fundo Monetário Internacional ilustram a idéia de ordem pública universal.

Uma outra ordem pública, ordem pública internacional no verdadeiro sentido da palavra, conforme será examinado adiante, se superpõe a quaisquer considerações de ordem pública interna. Aqui não podemos dizer que a aplicação do tratado fica condicionada a não conflitar com a ordem pública interna, como dissemos acima com relação aos tratados em geral, pois trata-se de um tratado que não visou meramente regular um instituto de direito, como as convenções da Haia sobre questões de direito privado. Temos aqui um tratado que visa introduzir ordem e segurança na economia internacional que depende diretamente da estabilidade da economia de cada um dos países participantes do sistema monetário internacional. Trata-se de uma questão em que a ordem pública interna de cada país depende e se submete ao que se considerou necessário para a ordem pública internacional. Não se trata, pois, de a ordem pública interna se render a um mandamento emanado de um tratado internacional, mas de conceber a ordem pública interna como dependente, interligada e condicionada à ordem pública internacional como definida em tratado internacional (DOLINGER, 1979, p.229).
De qualquer forma, fica caracterizado que com o Acordo do Fundo criou-se uma nova filosofia em matéria de direito monetário-cambial, no que concerne à aplicação de normas emanadas do direito interno, nos foros de outros países. Ao invés de serem repelidas estas normas como atentatórias à ordem pública do foro, como acontecia outrora, atualmente elas são respeitadas e aplicadas em atenção a uma ordem pública superior que comanda o recíproco respeito e a mútua preocupação pelo atendimento das normas que visam a proteção e a estabilidade econômica dos países membros da sociedade internacional (DOLINGER, 1979, p. 232).
CAPÍTULO VII - A ORDEM PÚBLICA NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO DO FUTURO
As realidades do direito internacional privado estão umbilicalmente ligadas às verdades do direito internacional público e das relações internacionais (DOLINGER, 1979, p. 239).
ORDEM PÚBLICA VERDADEIRAMENTE INTERNACIONAL OU ORDEM PÚBLICA UNIVERSAL
A ordem pública no Direito internacional privado tem características eminentemente negativas, pois impede a aplicação da lei normalmente aplicável segundo indicação de uma regra de conexão. [...] Outra ordem pública há muito tempo vem se delineando mas ainda não mereceu a devida atenção da doutrina. Referimo-nos ao que se poderia denominar de “ordem pública verdadeiramente internacional” ou “ordem pública universal” (DOLINGER, 1979, p. 242).
Alguns autores fizeram alusões a uma ordem pública internacional relativa às leis que proíbem a pirataria sobre o mar, e as violências inúteis na conduta das hostilidades [...], ao mercado de brancas, de negros e de escravos [...](DOLINGER, 1979, p. 243).
Uma ordem pública universal compreenderia os interesses que os Estados têm em comum, ou seria sistematizada a partir dos princípios gerais de direito utilizados em várias convenções, ou de uma moral universal, ou dos direitos fundamentais da humanidade. Poderia ser comparada à ordem pública interna ou ao direito comum da humanidade. No entanto, nada disso interessa para caracterizar uma ordem pública verdadeiramente internacional que se relacione com a ordem pública do direito internacional privado (DOLINGER, 1979, p.243-245).

A ordem pública verdadeiramente internacional relacionada ao direito internacional privado é uma “ordem pública interna de efeitos internacionais, caráter generalizado” e compartilhada por vários países (DOLINGER, 1979, p.246).

A ordem pública verdadeiramente internacional visa, em primeiro lugar, proibir e punir os delitos internacionais como o tráfico de escravos, o tráfico de entorpecentes, a pirataria, o terrorismo, e principalmente os crimes de guerra, os crimes contra a paz, os crimes contra a humanidade e o crime de genocídio [...]. São os crimes que causam dano vital aos interesses internacionais, minando os fundamentos e a segurança da comunidade internacional, violando valores morais e princípios humanitários universais. Mas fosse a ordem pública internacional constituída tão somente destes itens e não nos ocuparíamos dela, eis que situada estaria no campo do direito internacional público e mais especificamente no campo do direito penal internacional. Acontece que esta ordem pública universal tem um raio de alcance muito mais amplo. Interessa-nos destacar uma ordem pública de caráter eminentemente positivo, que funciona em sentido oposto ao da ordem pública no direito internacional privado que vimos estudando até agora (DOLINGER, 1979, p.246).
A ordem pública verdadeiramente internacional ou universal é aquela que inspira uma determinada disciplina das relações privadas internacionais, através de tratados e convenções. É a ordem pública que comanda uma atitude uniforme de todos os membros componentes da sociedade internacional (DOLINGER, 1979, p.247).
Isto significa que a tradicional ordem pública interna de efeitos internacionais se curva diante da ordem pública verdadeiramente internacional que exige dos membros das Nações Unidas renunciar a determinadas regras e tradições em prol do bem maior da comunidade internacional (DOLINGER, 1979, p.248).
Enquanto a ordem pública de Direito Internacional privado é um princípio de caráter excepcional, cuja aplicação deve ser restrita ao estritamente necessário, já a ordem pública realmente internacional será cada vez mais ampla e abrangente. [...] Esta será uma nova comitas gentium, em que os Estados considerarão os interesses dos outros Estados e às vezes irão ao ponto de sacrificar o cumprimento de suas próprias leis (DOLINGER, 1979, p.249).
A ordem pública interna visa proteger a política, a moral e a economia de cada país; a ordem pública universal há de defender padrões de moralidade, de equidade e de igualdade entre os Estados para a manutenção de uma ordem em que, em última análise, estão interessados todos os membros componentes da sociedade internacional (DOLINGER, 1979, p.251).
CONCLUSÕES
VII - FUTURO
Esta ordem pública verdadeiramente internacional, aludida por alguns autores de forma inadequada, não foi ainda conceituada nem compreendida pela Doutrina. Ela abrange, além do direito penal internacional, uma série de medidas e criações convencionais, como o FMI e o GATT, que visam criar uma ordem pública positiva, de caráter universal, garantidora do bem estar e dos interesses de cada uma das comunidades que compõem a sociedade internacional. A ordem pública universal comandará o respeito em cada jurisdição pela ordem pública dos outros Estados, poderá fazer com que as jurisdições abdiquem de aplicar seu próprio direito e até seu princípio de ordem pública, numa nova e ampliada comitas gentium [...] (DOLINGER, 1979, p.263).

terça-feira, 5 de julho de 2011